A Capela do Senhor dos Milagres foi edificada em meados do século XVIII, desconhecendo-se no entanto quem foi o seu encomendante, ou a data específica da sua fundação. Este pequeno templo reflete a tipologia de planta centralizada desenvolvida em Portugal durante a centúria de Seiscentos, ligada à arquitetura dos círculos da corte e à afirmação da nova dinastia de Bragança, ambos legitimados pelo culto eucarístico, com o qual este género de planta estabelecia uma forte analogia (…). Contudo, no século XVIII esta ideia foi perdendo importância e, “a planta centralizada era escolhida por razões puramente formais”.
Enquadra-se no período do Barroco (tardio) já na transição para o Rococó. No exterior assiste-se à repetição da simetria dos planos e à constituição de dois volumes: o do altar-mor e sacristia – retangular; e do corpo principal de entrada – octogonal. No interior, a nave do templo apresenta planta octogonal, com dois altares laterais, dois púlpitos, ambos simétricos e um altar central – o grande palco do Barroco. A pintura e decoração são exaustivas nos altares e estátuas, assumindo o deslumbramento simétrico e teatral do Barroco. A palma, ou concha, é um dos elementos típicos do barroco e surge várias vezes, em maior ou menor escala, destacando-se as duas que ladeiam a entrada principal, sendo, pois, um exemplo perfeito das noções de volume, simetria e movimento. O teto, do corpo octogonal, é enriquecido com uma cúpula rematada com chave dourada, de onde pende elemento decorativo composto por motivos vegetalistas e uma pinha.[1] Já o teto da capela-mor, em trompe-lóeil, (técnica artística que, com a utilização de truques de perspetiva cria uma ilusão ótica, fazendo que as suas formas e dimensões aparentem três dimensões), figura a Assunção da Virgem Maria. Como nos diz Horácio Bonifácio, «Não raramente estas intervenções funcionam como uma arquitetura enganadora, designadamente através de paredes cobertas de azulejos, cuja temática arquitetónica expressa em trompel’oeil “constrói” um aparente novo interior, um falso novo edifício. Noutros casos, a utilização nos tetos de pinturas ilusionistas e particularmente o emprego de várias perspetivas, vão contribuir para alterar e falsear o sistema de cobertura, ou mesmo prolongar a altura do edifício. De norte a sul do país, com maior ou menor intensidade, a arquitetura cobre-se de enfatuações decorativistas, que, encerradas inicialmente em altares, retábulos ou tetos, alastrarão à totalidade das paredes, numa procura constante de configurar novas espacialidades e volumetrias.»[2]Esta, é uma das pequenas maravilhas que o templo alberga, embora talvez pouco visitado, devido ao gradeamento permanente do Arco Triunfal.
Ao nível da pintura, foi usada a técnica do fresco: pigmentos naturais em pó, diluídos na hora em que se faz a sua aplicação/decoração; e da estatuária, recorre à técnica do estofo: capeamento que é dado à estátua antes da pintura propriamente dita, de forma a dar relevo à pintura e a uma outra noção muito importante no barroco, a ideia de movimento. O retábulo-mor é produzido em madeira de castanho, dourada e policromada onde surgem representados os cinco símbolos do martírio de Cristo, nomeadamente a cruz, a coroa de espinhos, os pregos, as lanças e o vinagre (dado de beber a Jesus a caminho do calvário). Ostenta várias cores e formas, destacando-se o sol presente no topo com a inscrição em latim IHS (Jesus Salvador do Homem). O sol está presente também no sacrário.
Os retábulos laterais são de talha dourada e policromada e foram produzidos ao gosto do estilo rococó. Possuem colunas de fuste liso, características deste estilo. O retábulo lateral direito acolhe ao centro a imagem de Nossa Senhora da Piedade (Pietá) que com Jesus nos seus braços representa o momento do calvário de Cristo. Por detrás desta surge uma pintura sobre madeira, que ilustra o momento em que Jesus é retirado da cruz, como cenário da figura que está diante dele. O retábulo lateral esquerdo acolhe a imagem de S. José, pai de Jesus. Por detrás desta e à semelhança do retábulo lateral direito, surge igualmente uma pintura sobre tábua, que representa a última ceia, com a particularidade de apresentar o apóstolo Judas com um saco de moedas. Relativamente aos púlpitos, seguindo a morfologia dos retábulos laterais, foram também produzidos ao gosto do estilo rococó.
[1] DUARTE, Marco Daniel – Tábua: História, Arte e Memória. Câmara Municipal de Tábua, Tábua, 2009.
[2] BONIFÁCIO, Horácio Manuel Pereira – As diferentes interpretações da arquitectura barroca em Portugal: notas para uma metodologia. In: Revista Arquitetura Lusíada, nº1, 2010.<Respeitamos o Acordo Ortográfico vigente á época.>